Matérias tributárias deixam de ser prioridade na gestão Toffoli
Ministro Dias Toffoli foi o primeiro presidente do STF a divulgar toda a pauta semestral de julgamentos de uma só vez
Apesar
de minoria entre os temas que estão na pauta de julgamento do Supremo
Tribunal Federal (STF) deste primeiro semestre, as ações de ordem
tributária têm potencial para gerar um rombo de bilhões de reais aos
cofres da União. São 21 casos ao todo – menos, por exemplo, do que os 33
penais previstos para ir ao plenário da Corte e também em relação ao
que foi julgado em gestões anteriores a do ministro Dias Toffoli.
Nos
anos em que Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski ocuparam a presidência
do Supremo, os casos tributários foram maioria, se comparado ao que foi
julgado de matéria penal. Na pauta de Toffoli, ocupam a quinta posição
em ordem de preferência. Os temas penais são maioria e já aparecem na
primeira sessão do ano, que será na quarta-feira. O atual presidente foi
o primeiro a divulgar toda a lista de julgamentos do semestre de uma só
vez.
“Há uma
prevalência das ações penais e isso é diferente do que vimos nas outras
presidências. Mas o ministro ainda tem quase dois anos pela frente no
cargo e nós não sabemos se no semestre que vem, por exemplo, ele vai
pautar mais temas tributários”, diz Eloísa Machado de Almeida, advogada e
professora da FGV Direito SP. “Pode ser que no final a conta fique mais
parecida com a dos seus antecessores.”
A
assessoria especial da presidência do Supremo justificou a “atenção
especial” aos processos criminais ao fato de a matéria ter prioridade
legal nos julgamentos. Além disso, afirmou por meio de nota ao Valor que
foram priorizados pedidos dos gabinetes dos ministros – processos com
julgamento já iniciado, cautelares e repercussões gerais.
Apesar
de a quantidade de processos tributários estar menor, existem questões
relevantes na pauta do primeiro semestre, segundo a coordenadora da
atuação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) no STF,
Alexandra Carneiro.
Duas
das ações podem custar R$ 64,6 bilhões para a União no pior cenário, ou
seja, se tiver que devolver os valores recolhidos pelos contribuintes
nos últimos cinco anos. O impacto, contudo, ela afirma, não será sentido
em 2019, já que os processos ainda dependeriam da inscrição em
precatórios.
Em
um desses casos os ministros vão decidir se os contribuintes têm
direito aos créditos de IPI sobre os insumos que foram adquiridos na
Zona Franca de Manaus. O julgamento (RE 592.891 e RE 596.614), que
retorna de um pedido de vista, está previsto para a sessão do dia 24 de
abril.
A
matéria começou a ser analisado pela Corte em 2016 e tem, até agora,
três votos favoráveis aos contribuintes. Se esse for o entendimento
final, as perdas para os cofres públicos serão de R$ 13,6 bilhões em um
ano e de R$ 49,7 bilhões se a União tiver que devolver os valores
recolhidos nos últimos cinco anos.
“Apesar
de haver no Judiciário o entendimento de que o contribuinte não pode
aproveitar crédito sobre produtos isentos ou com alíquota zero, há
chances de vitória porque esse caso é diferente. Se as empresas que
adquirem os insumos não tiverem a oportunidade de tomar crédito, a
isenção que haveria na zona franca, na prática, deixa de existir”,
contextualiza o advogado Bruno Teixeira, do escritório TozziniFreire.
No
mesmo dia está outro tema relevante, também citado pela procuradora da
PGFN. Trata sobre a validade da contribuição a ser recolhida pelo
produtor rural (pessoa física) que desempenha as suas atividades em
regime de economia familiar, sem empregados permanentes, sobre a receita
bruta proveniente da comercialização da sua produção (RE 761.263).
As
perdas para a União, se os ministros decidirem em favor dos produtores,
seriam de R$ 3,4 bilhões em um ano e de R$ 14,9 bilhões se o governo
precisar devolver o que eles pagaram nos últimos cinco anos.
Da
pauta já divulgada pelo presidente da Corte, o ministro Dias Toffoli,
advogados tributaristas chamam a atenção ainda para outros dois casos
também importantes aos contribuintes e que, dependendo da decisão, podem
afetar as contas do governo.
Em
um deles, os ministros vão decidir sobre a constitucionalidade da trava
de 30% para a compensação de prejuízos fiscais de Imposto de Renda
(IRPJ) e de bases negativas de CSLL. Trata-se do RE 591.340, que tem
julgamento previsto para o dia 29 de maio. Não há projeção ainda da
Receita Federal sobre o impacto para os cofres públicos.
O
outro julgamento que, segundo advogados, deve ser acompanhado com
atenção envolve a constitucionalidade dos regimes não cumulativos de
recolhimento do PIS e da Cofins. São dois processos diferentes, o RE
570.122, sobre a Cofins, e o RE 607.642, específico ao PIS. Ambos já
tiveram julgamento iniciado no plenário da Corte.
O
que trata sobre a Cofins foi julgado em 2017, contra os contribuintes, e
retorna somente para que seja fixada a tese da repercussão geral. O
outro, sobre o PIS, volta de um pedido de vista do ministro Marco
Aurélio. Já há, no entanto, seis votos no mesmo sentido da Cofins.
A
discussão envolve valores altos. O impacto, para a União, seria de
cerca de R$ 140 bilhões se tivesse que devolver o que foi recolhido nos
últimos cinco anos. É pouco provável, porém, que haja uma mudança de
entendimento, segundo advogados. O julgamento deve ocorrer ainda neste
mês, na sessão marcada para o dia 20.
Ficou
de fora da pauta, no entanto, um dos temas mais esperados pelo mercado.
Os embargos de declaração sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo
do PIS e da Cofins não foram ainda liberados pela relatora do caso, a
ministra Cármen Lúcia.
“Esse
é o tema que está no radar das empresas”, afirma a advogada Glaucia
Lauletta Frascino, sócia do escritório Mattos Filho. “Quase todo dia um
cliente pergunta sobre esse julgamento. Essa não é nem a pergunta de um
milhão de dólares, é a pergunta de muitos milhões”, ela acrescenta.
Para
a advogada, “há muito assunto para pouca pauta”. Ela diz que existem
mais de cem temas tributários com repercussão geral reconhecida à espera
do julgamento do Supremo, mas pondera que são só 11 ministros e apenas
duas sessões semanais. “E tem ainda todos os outros assuntos. Não vejo
como uma anormalidade haver um número maior de ações penais. Esse é um
reflexo do ambiente que temos no país atualmente.”
O
tema penal está tão forte na agenda brasileira, segundo o advogado
criminalista Pedro Ivo Velloso, do escritório Figueiredo e Velloso
Advogados, “que é normal o STF ter que analisar muitos processos sobre a
matéria”. “Quanto mais teses penais o STF julgar, menos processos sobre
o tema chegarão à Corte.”
Por Joice Bacelo e Beatriz Olivon | De São Paulo e Brasília
Fonte: Alfonsin (alfonsin.com.br)