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  • Segunda à Sexta

A tributação do nada

Todo brasileiro sabe que os impostos pagos direta ou indiretamente no país são desproporcionalmente grandes em relação ao serviço público ralo devolvido à população. Também se sabe que o problema não está no volume arrecadado, mas sim no destino que se dá ao dinheiro: uma rede de ineficiências, corrupção crônica e estruturas palacianas incompatíveis com a falta de leitos hospitalares, a qualidade ruim do ensino e a insegurança no país. Porém, há um aspecto ainda pouco debatido e mais perverso que o mau uso dado à arrecadação – a tributação sobre a renda ou sobre resultados que não acontecem de fato.

Entre as políticas adotadas pelo Plano Real para controlar a inflação, extinguiu-se a correção monetária da declaração de Imposto de Renda e da contabilidade das empresas. Sem a correção monetária, deixou-se de descontar da apuração de renda o efeito inflacionário – o que, por si só, já é ruim, pois gera a ilusão de ganhos nominais superiores aos ganhos reais. Porém, a inflação não foi extinta, muito menos a tributação que incide sobre ganhos inflacionários. Isso gera uma distorção empobrecedora e que muitas vezes induz a escolhas ruins, principalmente nos investimentos.

Para entender essa armadilha tributária, pense na compra de um imóvel como investimento. Você o adquire por R$ 100 em uma determinada data e vende três anos depois por R$ 140. Caso você não se enquadre em alguma categoria de isenção, seu lucro de R$ 40 será tributado em 15%, resultando em um recolhimento de impostos de R$ 6. Seu lucro final, portanto, será de R$ 34.

Entretanto, considere que a inflação oficial acumulada nesses mesmos três anos foi de 20%. Na prática, o que você conseguia comprar por R$ 100 agora está custando R$ 120, e seu lucro imobiliário tributável na venda de R$ 140 foi de apenas R$ 20. Mas, como o imposto cobrado foi de R$ 6, seu lucro líquido verdadeiro foi de apenas R$ 14, ou de 11,7% em três anos, e não de R$ 34 ou 34%. No exemplo, sua rentabilidade cai para um terço da estimativa do governo. E, pior, os R$ 6 de impostos equivalem a 30% do lucro de R$ 20, e não os 15% estabelecidos em lei.

Quanto maior o intervalo de tempo entre a compra e a venda e quanto maior a inflação, mais intenso é esse efeito da tributação do nada. E esse efeito não atinge apenas imóveis, mas também o mercado de ações e os lucros de empresas sazonais ou com ciclos de produção mais longos.

Ao manter por anos a prática da tributação sobre o lucro nominal, o governo empobreceu a sociedade e impôs uma carga tributária muito superior à já escandalosamente apurada. Agora, com a queda da inflação, a tributação do nada perde força, a sociedade passa a reconhecer ganhos mais robustos em seus investimentos, e a arrecadação volta a prevalecer sobre ganhos efetivos. É um fator interessante de prosperidade. Esperamos que tenha vindo para ficar.

Fonte: Época – Escrito por Gustavo Cerbasi

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